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BLOG DO OSNY: Um almoço com MARADONA

Na estreia deste blog, minha sincera homenagem ao Camisa Diez que nos deixou recentemente

Nenhum dos meus colegas da Redação entendeu quando apareci de terno e gravata no dia seguinte à conquista do penta pela seleção brasileira, na Copa do Mundo 2002. A maioria veio vestida com a Amarelinha, com muito orgulho! Quando me perguntaram cadê minha Amarelinha, respondi que deixei no cabide, porque “hoje vou almoçar com o Maradona!!!”

– Como que é?!!!
– Isso mesmo! Ma-ra-do-na!!!

Eu era repórter de esportes do extinto jornal International Press (IPC) e no dia anterior, domingo, tinha trabalhado na cobertura do penta no Estádio Internacional de Yokohama. No dia seguinte, já estava agendado uma entrevista coletiva com Diego Armando Maradona, no salão nobre do Clube dos Correspondentes Estrangeiros do Japão, em Yurakucho, Tóquio.

Diego Maradona, durante almoço no Clube dos Correspondentes Estrangeiros do Japão em Tóquio

Preferi vestir como os demais jornalistas, terno e gravata, em respeito ao Camisa Diez da Argentina, aquele que marcou o mais belo gol de todas as Copas.

Apesar de convidados, os cerca de 50 jornalistas tiveram de pagar ¥ 1.500 para o almoço servido. Em dado momento, pela porta do salão entra um Diego roliço, bonachão, camisa pólo azul, bermudão e tênis. Muito longe do quadro que nossa memória pendura na parede, aquele Diego dos gramados, o Diego dos gols impossíveis, o Diego da Copa do Maradona, da qual, dizem que ele a conquistou sozinho no México em 1986.

Don Diego acomoda-se na mesa, onde uma placa anuncia guest speaker, o convidado palestrante. O interlocutor, um jornalista inglês, agradece a presença do astro argentino e no discurso de introdução, recorda o Mundial 86: “Mr. Maradona, lembro daquele seu gol com “a mão de Deus” justamente contra o meu English Team”.

Famoso gol com a “Mão de Deus” contra a
Inglaterra na Copa do Mundo – México 1986 (foto Getty Imagens)

Maradona apenas sorri e começa seu discurso lembrando: “os americanos atiraram duas bombas nucleares e no entanto, eles podem passear tranquilamente por Tóquio. Quero dizer também que (Alberto) Fujimori cometeu desastres no Peru e hoje está no Japão”.

Ele se referia ao “visto negado”. Por ter um passado negro em sua vida relacionado a drogas, o governo japonês negou visto de entrada no país. Entretanto, devido ao apelo do governo argentino, para quem o ex-jogador seria seu embaixador do Turismo e Esportes, a ministra da Justiça do Japão, Mayumi Moriyama, concedeu visto especial a Maradona, para que ele pudesse presenciar a final da Copa do Mundo, entre Brasil e Alemanha.

“Isso que não consigo suportar das leis. O ser humano precisa ser colocado em primeiro lugar. Se fiz mal a alguém, foi a Diego Armando Maradona, não a nenhum japonês e não podem me proibir de entrar neste país.” Assim, Maradona conseguiu o carimbo no seu passaporte e desembarcou no Japão para assistir a grande final da Copa do Mundo 2002.

No decorrer da palestra, uma jornalista japonesa perguntou a Maradona se ele tinha algum problema com dietas. O ex-jogador, então com 100 quilos, segundo informou o diário esportivo Sports Nippon, respondeu com humor irônico: “sim, é verdade! Porque com o dinheiro que ganhei jogando futebol, posso comer tranquilamente. E ganhei honestamente. Não roubei ninguém. Mas desde a última vez que vi a senhora, agora me parece estar mais velha”.

A edição do dia 29 de junho de 2002, do jornal Sports Nippon, estampou capa inteira com a foto de Maradona desembarcando no aeroporto de Narita e título em garrafais: HARADONA!? (ハラドナ). “Hara” em japonês significa “barriga”, um trocadilho com a junção Barriga e Maradona.

Primeira página do jornal Sports Nippon: HARADONA

Pois lembrei de outro trocadilho, na Copa do Mundo Espanha 1982, quando o Brasil do Zico venceu a Argentina do Maradona por 3 a 1. A torcida brasileira gritava “Cadê Maradona? Virou Dona Mara!”

Ele critica a Copa do Mundo, o Brasil, o Rei Pelé. Não seria diferente, é Diego Maradona.

Quando o assunto é futebol e Copa do Mundo, Maradona segue disparando sua metralhadora falante. Para o eterno camisa 10 da alviceleste, o Mundial foi “medíocre”. “Uma análise da final é a soma de um campeonato tecnicamente medíocre. Brasil e Alemanha, creio que os que acreditam entender de futebol, esperavam uma outra final. Vendo Alemanha, com todo o respeito do mundo, é a pior Alemanha que poderia se apresentar em todos os tempos. Respeito os jogadores alemães, mas joguei contra equipes alemãs muito poderosas. O deste Mundial foi a pior que já vi. Ainda assim, todos chegaram à final com méritos próprios.”

Por três vezes, o telefone celular de algum jornalista presente tocou. Por três vezes, Maradona humorado disse para “atender” que ele esperaria.

Matéria no jornal International Press: Maradona atende aos torcedores, mas para evitar tumulto, teve que escapar pela cozinha

Ao final da palestra, recebeu de presente o livro Maradona – Autobiografia, traduzida em japonês. Inúmeros torcedores argentinos trazem camisas alvicelestes para serem autografadas. Um outro traz a bola “Fever” da Copa 2002. Maradona joga a pelota para cima e mostra que ainda tem habilidade para fazer embaixadinhas de cabeceio.

A multidão foi aumentando, Diego tenta atender a todos. Mas num dado momento, acontece uma invasão. O interlocutor inglês puxa Maradona para retirá-lo do local e “escapam” pela cozinha, deixando a tietagem frustrada. E o inglês leva Maradona pela mão – a mesma “mão de Deus”. Porém, desta vez, foi Deus quem o levou!

Perfil Blog do Osny (Japão Aqui)

Jornalista, no Japão desde 1995, cobriu Copa do Mundo (França 1998, Japão/Coreia 2002) e 15 Mundiais de Clube. Metaleiro, roqueiro, pagodeiro e outros “eiros” …

Japão Aqui e o brasileiro cada vez mais “japonês”. De refugiado econômico a imigrante nipo-brasileiro, fizemos o caminho inverso dos japoneses que atravessaram oceanos após a segunda guerra mundial.

Em 2007 após atingir a marca de 316.000 brasileiros oficialmente residentes no Japão o “Lehman shock” em 2008, esvaziou nossa comunidade em cerca de 140.000 pessoas, nos anos que se seguiram. Hoje em 2019, voltamos a crescer atingindo a marca de 193.798 brasileiros residentes (junho-2018 / Ministry of Internal Affairs and Communications).

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